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"Numa época de dissimulação, falar a verdade é um ato revolucionário." (George Orwell)

domingo, 14 de outubro de 2007

Assédio Moral: como identificar?

Revista Partes - Especial sobre Assédio Moral

Identificando o Assédio Moral no trabalho Carolina de Aguiar Teixeira Mendes

Segundo o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra “assédio” significa “insistência impertinente, perseguição, sugestão ou pretensão constantes em relação a alguém”.[1]

Ultimamente, tem-se ouvido muito falar em assédio moral, embora não seja grande novidade na história da humanidade. Mas, afinal, o que é assédio moral no trabalho? Você conseguiria identificar se está sendo vítima desse mal?

Segundo a médica Margarida Barreto, médica do trabalho e ginecologista, assédio moral no trabalho é “a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego”[2].

Primeiramente, fala-se em “exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras”. O trabalhador deve se sentir extremamente rebaixado, oprimido, ofendido, inferiorizado, vexado e ultrajado pela ação do assediador, que o persegue e o importuna.

Para citar um exemplo de humilhação no trabalho, apresentaremos um processo iniciado na 4a Vara do Trabalho de São Bernardo do Campo, com posterior Recurso Ordinário dirigido ao TRT/SP, no qual a empresa foi condenada a indenizar a reclamante por danos morais. [3]

Consta dos autos que a vítima vendia cotas para um consórcio e recebia tratamento desrespeitoso por parte de seus superiores, no intuito de vender e atingir metas. Eles aconselhavam-na a “sair com clientes” ou “vender o corpo”, além de agredir verbalmente não só à reclamante, mas também aos vendedores que não alcançavam as metas, fazendo comentários irônicos, aplicando advertências, e tratando-os de forma extremamente grosseira, inclusive com xingamentos. Tudo acontecia na presença de outros funcionários, os quais serviram de testemunha no decorrer do processo.

Indiscutivelmente, havendo laudo clínico ou não, a reclamante teve sua saúde psicológica afetada, além de sua vida profissional e privada. Não houve respeito algum por parte dos superiores à sua “dignidade humana”, posto ter sido “exposta ao ridículo” e tratada como simples objeto, e não como trabalhadora que era.

O assédio moral restou caracterizado pelo desrespeito à honra, moral e dignidade da trabalhadora. Houve, ainda, patente discriminação à figura da mulher, como se devesse estar à disposição de qualquer demanda do homem. Assim, consagrou-se evidente seu direito em requerer indenização por danos morais, a qual lhe foi concedida no valor de dez vezes o valor recebido normalmente no trabalho.

Dando continuidade à análise do conceito de assédio moral, ressalta-se que a exposição a esse tipo de situação deve ser “repetitiva e prolongada durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções”.

Para bem ilustrar o assunto, citaremos o caso de Denise Gomes, 50 anos, professora em Belo Horizonte, cujo depoimento foi dado à Revista Veja, e publicado na Edição 1913, de 13 de julho de 2005. Através de ação judicial, a professora obteve a rescisão do contrato de trabalho, além de indenização no valor de 25 mil reais. Vejamos as declarações de Denise:

“Entre 2004 e 2005, fui moralmente assediada por coordenadores do departamento da universidade onde trabalhei até o mês passado. Depois de um período de afastamento, encontrei um ambiente hostil. Deram-me um horário irracional. Em um dia, tinha de trabalhar doze horas ininterruptas. Quase todos os dias, recebia ofícios de advertência, sem que nada tivesse feito de errado. Elegi-me para uma comissão de prevenção de acidentes e passei a ser ainda mais humilhada. Deram-me atividades de orientação de estagiários, com a justificativa de que eu não tinha qualificação para dar aulas. Numa reunião, o coordenador agrediu-me aos berros na frente de colegas e funcionários. Cheguei a ser colocada numa salinha, sem nada para fazer. Nesse processo estressante, adoeci e voltei a sofrer convulses depois de 24 anos sem ter esse problema. Também perdi mais da metade da minha renda.” [4]

Extrai-se do depoimento da senhora Denise que a humilhação acontecia na universidade, ou seja, em seu ambiente de trabalho e, ainda, no exercício de suas funções. Ademais, o assédio era repetitivo, acontecendo quase diariamente, além de prolongado, posto ter ocorrido por vários meses, entre 2004 e 2005.

Explica, ainda, Margarida Barreto, ser a perseguição mais comum em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas[5], predominando condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s).

Segundo o dicionário Houaiss, relações assimétricas seriam relações desiguais, desproporcionais e diferentes, ou seja, desarmônicas.

Apesar do assédio moral no trabalho ser mais comum em relações hierárquicas, ou seja, de chefe(s) para subordinado(s), há ainda casos de colegas de trabalho que assediam a outros colegas.

Na mesma edição da Revista Veja estão as declarações de Ronaldo Nunes Carvalho, 37 anos, na época vendedor em uma cervejaria em Porto Alegre. Vejamos:

“Durante um ano e quarto meses vivi num inferno, como vendedor de uma companhia de bebidas. A ordem da gerência era ridicularizar quem não cumpria as metas. Nas reuniões que precediam as nossas saídas para a rua, cada vendedor relatava os resultados do dia anterior. Quando eu era um dos que não tinham alcançado a meta, me via obrigado a pagar prendas, como subir na mesa e fazer flexões. Ao mesmo tempo, meus colegas eram instigados pelos gerentes a passar as mãos nas minhas nádegas. Às vezes, era obrigado a desfilar de saias ou passar por um corredor polonês formado pelos colegas, puvindo palavrões e ofensas, como ‘burro’ e ‘imprestável’. Em seguida, eu ia para o banheiro e chorava escondido. Um dia de trabalho depois disso era o maior sacrifício. Em casa, vivia estressado, brigava com a minha mulher. Estava a ponto de explodir.” [6]

Perguntamos: os colegas eram obrigados a humilhá-lo? A resposta pode ser: “Sim, ou ele(s) perderia(m) o emprego”. Discordamos.

Analisando filosoficamente, Sócrates acreditava que era melhor sofrer o mal que infligi-lo. Hannah Arendt, uma das filósofas mais importantes do século XX, em seu livro “Responsabilidade e Julgamento”, nos explica tal pensamento:

“Se somos confrontados com dois males, assim reza o argumento, é nosso dever optar pelo menor, ao passo que é irresponsável nos recusarmos a escolher.” [7]

Ou seja, entre perder o emprego e humilhar o colega, prefere-se o mal menor de acordo com sua acepção: humilhar o colega.

E Arendt expressa sua discordância com a assertiva de Sócrates:

“Esse argumento é um dos mecanismos embutidos na maquinaria de terror e criminalidade. A aceitação de males menores é conscientemente usada para condicionar os funcionários do governo, bem como a população em geral, a aceitar o mal em si mesmo.”

(…)

“Infelizmente, parece ser muito mais fácil condicionar o comportamento humano e fazer as pessoas se portarem de maneira mais inesperada e abominável do que convencer alguém a aprender com a experiência, como diz o ditado; isto é, começar a pensar e julgar em vez de aplicar categorias e fórmulas que estão profundamente arraigadas em nossa mente, mas cuja base de experiência foi esquecida há muito tempo, e cuja plausibilidade reside antes na coerência intelectual do que na adequação e acontecimentos reais.” [8]

Tanto a gerência quanto os outros funcionários assediaram moralmente a Ronaldo. Se os colegas de trabalho da vítima tivessem usado da faculdade humana de pensar, poderiam julgar a situação de acordo com suas experiências e desobedecer as chamadas “ordens superiores”. Se não o fizeram, é porque estavam/foram condicionados a concordar com o que lhes foi ordenado, e preferiram o mal menor (a humilhação do colega) à demissão individual e/ou coletiva.

Pensar não é uma atitude mecânica, mas um diálogo silencioso e profundo do homem consigo mesmo, que leva a uma decisão de acordo com a moral. Se tivessem parado para “pensar” (conforme o exposto acima), chegariam à conclusão de que seriam incapazes de conviver consigo (lê-se: por se constatarem, então, malfeitores) para o resto de suas vidas.

Neste sentido, para Hannah Arendt:

“…o pensamento que devemos lembrar é uma atividade, e não o desfrute passivo de algo.

(…)

“A moralidade diz respeito ao indivíduo na sua singularidade. O critério de certo e errado, a resposta à pergunta: “O que devo fazer?”, não depende, em última análise, nem dos hábitos e costumes que partilho com aqueles ao meu redor nem de uma ordem de origem divina ou humana, mas do que decido com respeito a mim mesma. Em outras palavras, não posso fazer certas coisas porque, depois de fazê-las, já não serei capaz de viver comigo mesma.” [9]

Mas para a sociedade atual, é muito mais “fácil” não pensar e, sim, simplesmente agir condicionadamente pelo meio externo e pela correria cotidiana. Assim, “pensar dá muito trabalho” e “é trabalho de filósofos”: eis o estereótipo que impera. Não é assim que dizem?

Bem, sobre o caso de Ronaldo, este foi indenizado no valor de R$21.600,00 (vinte e um mil e seiscentos reais), quantia considerável nos tempos atuais. Porém, dinheiro algum nesse mundo é capaz de pagar o sofrimento físico e psicológico da vítima, cujas marcas podem permanecer por uma vida inteira.

Ainda segundo os estudos da Dra. Margarida no trabalho retro mencionado, a intenção do assediador moral seria “desestabilizar a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego”.

Quem agüentaria ficar num ambiente de trabalho onde todos caçoam de suas atitudes? A demissão voluntária traz menos despesas à empresa, obviamente. É muito cômodo colocar o funcionário numa posição desconfortável a ponto dele mesmo “pedir as contas”.

Devemos diferenciar o assunto aqui tratado com “a natural pressão decorrente do mercado cada vez mais competitivo do mundo globalizado, ou o exercício regular do direito do empregador exigir produtividade de seus empregados.”[10]

Isso quer dizer que a pressão do dia-a-dia na empresa, a correria, as intermináveis tarefas, geralmente em nada têm a ver com o assédio. Estamos vivendo num mundo globalizado que tem uma de suas características a competição real e a tendência de correr para não ficar para trás. Essa é a realidade não só empresarial, mas, principalmente, no setor público.

A situação é bem diferente quando o chefe ou mesmo o colega de trabalho começa a agir de maneira a humilhar e rebaixar ao outro. Aí deve-se ficar atento para não cair numa cilada emocional que pode destruir emprego, convivência social e familiar, e até mesmo a própria vida.

Os danos que o assédio moral pode causar ao empregado são seríssimos. Também conhecido como síndrome del acoso institucional, acoso moral, psicoterror, coação moral ou mobbing, o assédio moral no trabalho ultrapassa não só as fronteiras internacionais, como também qualquer categoria profissional. Médicos, advogados, operários, vendedores, representantes comerciais, diaristas, não há preferência profissional na desta perversidade.

A vítima pode sofrer “danos emocionais e doenças psicossomáticas, como alterações do sono, distúrbios alimentares, diminuição da libido, aumento da pressão arterial, desânimo, insegurança, entre outros, podendo acarretar quadros de pânico e de depressão. Em casos extremos, pode levar à morte ou ao suicídio.”[11] Ademais, a capacidade laborativa do empregado é extremamente atingida.

O assédio moral dá direito à rescisão indireta. O trabalhador ainda pode pedir indenizações morais e/ou materiais. Para tanto, faz-se necessária consistente coleta de provas. Eis aí a parte mais difícil: como provar? A dificuldade existe por tratar-se de uma violência sutil, psicológica, e não física. Acontece quase que de maneira “invisível”.

Meras alegações de nada valem ao Judiciário. A este interessa somente as provas, cuja coleta pode transforma-se em grande teste de paciência ao assediado. Tão logo a vítima perceba que está sendo assediada moralmente, deve reunir documentos escritos pelo assediador, como e-mails, cartas e bilhetes, além de laudos médicos, cartões de ponto, e quaisquer outros documentos que provem uma perseguição. Gravações das ofensas do malfeitor diretamente à vítima também são possíveis. Outra prova importantíssima são as testemunhas, que podem comprovar gestos, comportamentos e palavras relativas ao assédio. Recomendável também é procurar um advogado para melhor aconselhar-se na questão probatória.

É relevante mencionar que as conseqüências de tamanho abuso atingem não apenas ao assediado, mas sim a toda a coletividade, violando os direitos à saúde e à dignidade humana, o que evidencia a gravidade do fato.

Ademais, há conseqüências para a própria empresa (como a baixa produtividade, por exemplo), e ainda para os governos, uma vez que as enfermidades dos trabalhadores resultam em gastos de atenção sanitária e seguridade social.

No sentido de combater este mal, a legislação ainda não é completa, existindo apenas poucas leis e alguns projetos de normas jurídicas, além das Sentenças Judiciais de Tribunais de diferentes instâncias começarem a servir de precedente judicial e jurisprudencial.

Andrea Fabiana MacDonald, advogada argentina, expõe em seu artigo “Um novo fenômeno no Direito do Trabalho: mobbing ou violência trabalhista”, algumas soluções propostas pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), entre as quais a solução preventiva:

“Soluções preventivas: que tomem em conta a origem da violência, e não somente seus efeitos;” [12]

A OIT entende que não adianta apenas criticar o malfeitor, indenizar as vítimas, gastar “rios” de dinheiro com a atenção sanitária e seguridade social; é necessário agir na fonte, na raiz, para que essa árvore não cresça mais. Precisamos entender as causas/motivações que levam o assediador a agir de determinada maneira é essencial para que as ações sejam de fato eficazes no combate ao assédio moral.

Não encontraremos, porém, a resposta mágica para a questão “como erradicar o assédio moral da sociedade”. Devemos entender o que se passa na mente do malfeitor para que possamos trabalhar as causas do mal, motivar a reflexão dos legisladores, e quem sabe até conscientizar os assediadores no sentido de mudarem seus valores e caráter.

Assim nos ensina o Prof. Jorge Luiz de Oliveira da Silva:

“De uma forma ou de outra, qualquer que seja o perfil do assediador, tudo converge para uma mesma constatação: é ele um fraco, porque demonstrou ser incapaz de construir sua própria felicidade, deixando de praticar atitudes que o conduziriam à conquista do bem.” [13]

Para atingirmos tal objetivo, faz-se necessária uma pesquisa interdisciplinar (Filosofia, Psicologia, Psiquiatria e Direito) no sentido de abrir os caminhos científicos e alcançar seu pleno desenvolvimento. Estes são os primeiros passos para a conquista de um bom ambiente de trabalho, onde haja respeito ao trabalhador e à cidadania.

Resgatar Napoleão: tem louco pra tudo,né?

O resgate de Napoleão
Animados pela Revolução Pernambucana de 1817, um grupo de emigrados franceses nos Estados Unidos elaborou um plano para resgatar o imperador em Santa Helena e trazê-lo para a América usando o Brasil como base de operações
por Vasco Mariz
A fama e o fascínio por Napoleão estiveram bem presentes no Brasil nos primeiros 20 anos do século XIX. Em 1801 o futuro imperador francês poderia ter sido o patrono do primeiro movimento pernambucano para fundar uma república no país, a frustrada conspiração dos Suassunas. A influência de sua figura e das idéias liberais da Revolução Francesa e da independência dos Estados Unidos da América esteve muito presente entre os revolucionários pernambucanos do século XIX, desde a conspiração de 1801 até o triunfo da Revolução de 6 de março de 1817 no Recife, que proclamou a República no Nordeste. Tais ligações se tornariam ainda mais estreitas quando militares bonapartistas exilados nos Estados Unidos, animados com o sucesso da Revolução Pernambucana, elaboraram um plano para resgatar Napoleão de seu cativeiro em Santa Helena, levá-lo a Pernambuco e depois a Nova Orleans. O elo entre os franceses e o Brasil era Antonio Gonçalves da Cruz, o Cabugá, homem enviado pelos revolucionários nordestinos como seu representante junto ao governo dos Estados Unidos no intuito de obter o reconhecimento formal da independência de Pernambuco. Os bonapartistas estiveram em contato permanente com Cabugá, que era um entusiasta do plano dos exilados franceses. A queda do império napoleônico, em 1815, significou para a quase totalidade dos oficiais dos exércitos franceses uma verdadeira catástrofe. Com o imperador nas mãos dos ingleses, os generais e coronéis que haviam combatido em Iena, Marengo, Leipzig, na Rússia e em Waterloo encontravam-se em situação muito difícil, pois ou prestavam juramento de fidelidade a Luís XVIII, ou se contentavam em receber meio soldo apenas. Por isso, numerosos oficiais preferiram o exílio nos Estados Unidos, onde havia oportunidades para “soldados de fortuna”. Assim, poucos meses depois da queda do império, já estavam nos EUA cerca de mil oficiais franceses de várias patentes, cujo único pensamento era libertar o imperador que definhava no clima severo da ilha de Santa Helena, em pleno oceano Atlântico, na altura de Pernambuco. O chefe da conspiração francesa nos EUA era o irmão do imperador, José Bonaparte, que fora rei da Espanha. Por meio do contato com Cabugá viram no Brasil uma possibilidade de colocar em prática seus planos, e numerosos militares franceses começaram a se deslocar para Pernambuco a fim de preparar a cabeça-de-ponte da operação. Durante os três meses de vida da República de Pernambuco, Cabugá adquiriu armamentos e munições e os enviou ao Brasil. Mesmo após a derrota da revolução, ele continuou ajudando os franceses exilados que planejavam o rapto de Napoleão e conseguiu articular a vinda para o Brasil de dois navios corsários, o Parangon e o Penguin.
Vasco Mariz É historiador e diplomata aposentado. Ex-embaixador do Brasil no Equador, Israel, Chipre, Peru e Alemanha, é autor de Villegagnon e a França Antártica (Nova Fronteira, 2000), entre outros livros (Fonte:http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/o_resgate_de_napoleao.html)

Che,herói de muitas causas!

Che Guevara - O herói de muitas causas
Descendente de um vice-rei do México, Ernesto Guevara de La Serna encarna o espírito revolucionário, e sua imagem segue cultivada até mesmo sem grande conhecimento de seu legado.
por Pascal Marchetti-Leca
Ernesto "Che" Guevara, em Cuba, 1964
Argentina, 1928. Uma embarcação descia o rio Paraná. A bordo, Ernesto Guevara Lynch e Célia de La Serna, sua jovem esposa grávida. Viajavam para Buenos Aires, onde ela planejava parir. Mas foi surpreendida pelas dores do parto, em Rosário de La Fé. O casal desembarcou com pressa. Momentaneamente, alojaram-se no número 480 da rua Entre Ríos, onde, num quarto improvisado, o menino veio à luz. Recebeu o nome do pai, Ernesto. A história, em seus anais, o registrou de bom grado como o Che. Até aquele momento, sua única herança havia sido um nascimento complicado. Os Guevara não demoraram para deixar a parada obrigatória. Retomaram o caminho do Atlântico e se fixaram, durante algum tempo, em San Isidro, perto de Buenos Aires, onde Ernesto Guevara Lynch trabalhou como engenheiro civil. Desportista assumida, Célia logo se inscreveu no clube náutico da cidade e cultivou o hábito de levar o filho para as margens do rio da Prata. Numa manhã de maio de 1930, ao sair da água, o garoto manifestou sintomas de resfriado. Contraiu, em seguida, uma pneumonia que degenerou em recorrentes crises de asma. "no mês de maio faz um clima glacial e um vento forte, minha mulher tinha ido banhar-se no rio com nosso filho ernesto. Quando fui procurá-los, a fim de levá-los ao clube para o café da manhã, encontrei o menino com o calção de banho, já fora da água, (...) Trincando os dentes. Ela ainda era inexperiente e não se dera conta de que as mudanças de tempo se mostravam perigosas naquela estação", comentou o pai.
Pascal Marchetti-Leca é professor na Universidade da Córsega e autor de Innominata (Dcl, 2001). (Fonte:www.uol.com.br)

Redução na jornada de trabalho

Artigo de Mônica Veloso

Trabalhar menos gera emprego e dá cidadania

Mônica Veloso - Secretária da Juventude da Força Sindical

A campanha pela redução da jornada semanal de trabalho para 40 horas é um instrumento estratégico para elevar o nível de consciência social e intelectual dos jovens e ao mesmo tempo inserir estas pessoas no mercado de trabalho. A idéia é que com uma carga menor de trabalho, eles vão melhorar sua qualidade de vida, pois terão mais tempo para o estudo, para fazer cursos de qualificação profissional, frequentar cinemas, teatros, bibliotecas, e fortalecer os laços familiares. Empregados e com um nível cultural muito melhor, os jovens passarão a ter perspectiva de uma vida digna e prazeirosa.

A campanha pela 40 horas semanais também é importante para aumentar a oferta de emprego para a juventude. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou recentemente uma pesquisa, de 2003, mostrando que os jovens desempregados no mundo, com idade entre 15 e 24 anos, são 88 milhões. Um recorde. Só no Brasil são 3,5 milhões sem trabalho. Isto nos assusta.

Além das políticas públicas específicas, como o 1º Emprego, queremos que os jovens tenham oportunidades efetivas de trabalho. Muito mais do que estagiário, trabalhar na informalidade ou em atividades secundárias, eles têm de ter um bom emprego com carteira assinada para ser profissionais.

O mercado hoje exige trabalhadores polivalentes, que precisam assimilar uma série de informações. Trabalhando menos horas, o jovem poderá estudar e se valorizar profissionalmente, aumentar a produtividade e melhorar a qualidade do produto ou serviço. Uma jornada menor é bom para o empregado, as também o é para a empresa.

Segundo estudo do Dieese, a semana de 40 horas pode criar 2 milhões de empregos. Sabemos que só isto não basta. É necessário que o governo estabeleça uma política de desenvolvimento para o país com investimentos nos setores que empregam mão-de-obra intensiva. Além disso, o movimento sindical precisa lançar uma campanha para combater a cultura das horas extras. Só assim o Brasil vai criar emprego, gerar e distribuir renda, aumentar a produção, intensificar as vendas. Socialmente, teremos uma país bem melhor, com sua juventude ocupada no trabalho, no estudo, na cultura e no lazer. Só assim vamos acabar com a reprodução da ignorância, da pobreza e da miséria

(Fonte:http://www.jornada.locaweb.com.br/artigos)

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Felicidade no trabalho

Felicidade no trabalho: quais os ingredientes?

Há cerca de 20 anos, um estudo feito pela Universidade de Ilinois com executivos das 400 maiores empresas americanas apontou seis coisas que fazem as pessoas felizes.

95% dos entrevistados apontaram para seis ingredientes, sempre na mesma ordem, que compõem a receita da felicidade no trabalho.

Pela ordem:

1. Ter desafios;

2. Perspectiva de crescimento;

3. Reconhecimento;

4. Integração da equipe;

5. Sentir-se útil;

6. Ter um líder respeitado.

E o dinheiro? Não entra na lista?

Não. Pelo menos não quando falamos em ser feliz no trabalho.

Felicidade não se compra.

Um ambiente que não ofereça desafios, por exemplo, não tem como ser um ambiente feliz.

Se não temos uma perspectiva de crescimento, de valorização, dentro da empresa, de nada valerá ganharmos rios e rios de dinheiro.

Quanto ao reconhecimento: um elogio, um sorriso e a palavra certa fazem milagres.

Ser uma peça fundamental dentro da engrenagem de trabalho é fundamental para os trabalhadores, pois dá segurança e satisfação pessoal.

Ter um líder que incentive os seus comandados, valorizando-os e defendendo-os quando surgirem os problemas é também algo sempre bem-vindo dentro das empresas.

Valorização, reconhecimento, respeito, incentivo e segurança são coisas que dinheiro algum pode comprar.

De que adianta ganhar 5000 reais por mês e viver num ambiente “carregado”?

Vai existir felicidade num ambiente sem respeito, sem valorização?

Conclusão: a pesquisa, feita há cerca de 20 anos, continua atualíssima.

E serve como um alerta para todos os administradores, sejam eles públicos ou privados.

Que eles invistam em ações que tragam felicidade aos trabalhadores, os dividendos advindos destas ações serão altamente benéficos tanto para as empresas e administrações públicas quanto para a sociedade.

Luiz Carlos dos Santos

Presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas empresas Públicas Municipais de Toledo

(SINTRAEP)

E-mail: sintraep@ibest.com.br

Homenagem ao Che (Parte 2)

Cubanos lembram revolucionário

Fidel Castro homenageia Che Guevara

Havana (AE-AP) - O convales­cente presidente licenciado de Cuba, Fidel Castro, homena­geou ontem o líder guerrilheiro Ernesto Che Guevara em um ar­tigo para marcar os 40 anos da morte do médico argentino convertido em revolucionário.

"Faço uma pausa na luta diá­ria para inclinar o semblante, com respeito e gratidão, ante o excepcional combatente morto há 40 anos", escreveu Fidel em seu mais recente artigo, publi­cado na edição de ontem'do jor­nal Granma. Fidel agradece "pe­lo que tentou fazer e não pôde em seu país de nascimento, pois foi como uma flor arrancada prematuramente do caule". Guevara nasceu em 14 de ju­nho de 1928 na cidade argentina de Rosario. Ele foi executado na Bolívia em 9 de outubro de 1967, depois de ser capturado por soldados bolivianos apoia­dos por agentes americanos. Os restos mortais de Che fo­ram exumados e levados a Cuba em 1997. Atualmente repousam em um monumento em Santa Clara, 270 quilômetros ao leste de Havana. No local, ontem o presidente provisório de Cuba, Raúl Castro, participou do ato central em homenagem a Che. Ernesto, o filho mais novo de Che Guevara, passou diante do túmulo de seu pai, no memorial da cidade de Santa Clara, montado numa Harley- Davidson, em uma singular homenagem que ele e seus colegas motociclistas cubanos prestaram ao guerri­lheiro nos 40 anos de sua morte. Ernesto guardou um minuto de silêncio à saída do monu­mento, para depois prestar um ensurdecedor tributo: acelerou à toda velocidade sua moto vi­nho modelo 45, de 1937. "Estou aqui como um 'harlista' a mais", declarou Ernesto, que vestia uma camiseta e jeans azuis e era apenas um bebê quando o pai partiu para a Bolívia, em no­vembro de 1965.

(Artigo publicado no jornal O Estado do Paraná, do dia 09 de outubro de 2007, pág. 11, em homenagem ao guerrilheiro Ernesto Che Guevara)

Homenagem ao Che (Parte 1)

DOMINGO. 7 DE OUTUBRO DE 2007 O ESTADO DE S.Paulo

Che, O imaginário do sacrifício

Guevara morto inaugurou o novo testamento de uma nova práxis política: o marxismo latino, moreno e místico

José de Souza Martins

Os meses e anos seguintes àque­le meio de tarde de 9 de outubro de 1967, quando Ernesto Che Guevara foi executado sumaria­mente por um tenente do exército boliviano, revelariam alguns dos vários mistérios que esta­vam contidos muito mais naquela morte do que naquela vida.

Naquele momento, ali na ma­ta, na encosta dos Andes, no em­blemático limite que separa a planície da montanha, a Améri­ca branca da América indígena, e que separa também a América guarani da América quéchua, começaram várias agonias. A começar por seus algozes dire­tos, a maioria dos quais morre­ria de forma estranha e inespe­rada nos anos seguintes, como que executados pela espada de fogo de um vingador invisível.

- A rajada de fuzil no corpo do Che rasgou o véu do templo de nossas certezas, do alto até em­baixo, libertando os medos e as contradições do nosso imaginá­rio político místico. Um novo testamento se abriu na memó­ria e na história dos povos latino­ americanos, no marco de um realismo mágico difuso e persistente. Era o incompreendido no­víssimo testamento de uma no­va práxis política, de uma comu­nhão de sangue entre a fé e a política, o misticismo de uma re­primida esperança, messiânica e milenarista.

A morte de Che desdisse mui­ta coisa que ele não queria pes­soal e conscientemente desdi­zer e disse muita coisa que ele não sabia estar dizendo. Che dis­se aos seus captores que valia mais vivo do que morto. Para o misticismo político latino-ameri­cano ele valia mais morto do que vivo. Porque só os mortos do sa­crifício humano podem ressuscitar e entrar na eternidade das esperanças milenaristas tão pró­prias desta América sem rumo. "Saio da vida para entrar na his­tória", escreveu Getúlio Vargas, quando Se encontrava no pórti­co da morte. São poucos os que tem a coragem moral e cívica de abandonar as conveniências mesquinhas do agora e enfren­tar essa passagem tenebrosa, quando ela se impõe, para servir ao povo na imortalidade genero­sa do sempre: Getúlio, Che, Al­lende. Eles sabiam que iam mor­rer porque o que personifica­vam neste mundo estava mor­rendo. Pouco importa se deles discordamos ou com eles concor­damos. No reino do sempre e da esperança não há fraturas, não é ele um mundo racional e lógico. O milenarismo latino-ameri­cano se expressa no rústico de libertações assim, que abrem a partir do mundo dos mortos a porta imaginária das inversões e as conversões, da busca da esperança nos contrários do que a morte rompeu. Quando o cadáver de Che Guevara chegou a La Higuera, para a autópsia e a injeção de formol que o preservaria, da pequena multidão fazia parte uma freira, de hábito branco, que aparece nas fotos, que ria o tem­po todo, misturada com milita­res, jornalistas e agentes da CIA, testemunhou o jornalista inglês Richard Gott, enviado pe­lo Guardian. O riso da freira ex­pressava a satisfação anti-co­munista de quem fora educada na religiosidade anacrônica de um mundo dividido entre o bem do capitalismo e o mal do comu­nismo. Mas aproximou-se do grupo, também, uma campone­sa que gritava "Assassino!", eco da propaganda militar na área. Ao ver o rosto do Che, silenciou e disse: "Meu Deus! Como ele era bonito!" Uma das fotos do corpo de Che, feitas na ocasião, foi difundida e interpretada co­mo o retrato de um Jesus Cristo latino-americano. Os católicos progressistas se tornariam os principais apóstolos dessa res­surreição simbólica. A morte de Che também con­sumou a ruptura interior da es­querda, isolou simbolicamente os partidos comunistas, esva­ziou o seu apelo proletário para dotar o inconformismo social dos pobres de uma mística sa­crificial que tem em Che o cor­deiro da história. Inverteu o nos­so imaginário de esquerda, fa­zendo da tradição popular e con­servadora, comunitária, religio­sa e anti-capitalista, o cerne de um novo socialismo, crioulo e popular, tendente ao étnico invertido. Nele, mestiços, índios e negros invertem imaginaria­mente a pirâmide social iníqua e branca, num projeto social e político de meios tons políticos, meios tons sociais, meios tons religiosos, meios tons econômi­cos, meios tons raciais. Na captura e morte de Che começou a sucumbir o marxis­mo mecanicista de Louis Al­thusser, viabilizado pela aventu­ra intelectual de classe média de Régis Debray, um dos primei­ros prisioneiros dos militares bolivianos. Místicos ambos, criaram e viabilizaram um mar­xismo tomista e departamenta­lizado, anti-marxiano, ideologi­camente útil às aventuras de classe média que se quer liberta­dora. A teoria do foco, de De­bray, da guerrilha dos desgarra­dos da elite, que desencadeia a revolução dos pobres, também morreu na quebrada do Yuro. A guerrilha de Che Guevara não se propunha a realização de uma revolução camponesa, a re­volução dos pobres na Bolívia, como se supõe ainda hoje. Era apenas uma extensão geopolíti­ca da Revolução Cubana, na perspectiva por ele proclamada de criar vários Vietnãs e por em xeque o poderio americano. No fim, Che lamentava não ter se aproximado dos camponeses da área 'da luta. Era tarde. Eles temiam os guerrilheiros. Por medo ou prudência, os delata­vam ao exército. Ou fugiam, abandonando as plantações e as casas. Mas a guerrilha não tinha neles a menor confiança, não os via como suj eitos da suposta re­volução latino-americana. Na tarde da véspera de sua prisão e antevéspera de sua morte, uma das últimas linhas do diário de Che é relativa a uma velha camponesa, que ti­nha uma filha prostrada e outra meio anã, a quem os guerrilhei­ros deram 50 pesos para que não os denunciasse ao exército, que já os cercara. Escreveu o Che que eram "poucas as espe­ranças de que cumpra (a pala­vra) apesar de suas promes­sas". Na edição eletrônica do diário, o Centro de Estudos Che Guevara, de Cuba, esclarece que "a velha das cabras nunca foi delatora, nunca falou com os militares, não denunciou o Che. Chamava-se Epifania Cabrera e já faleceu. Foi-se para a monta­nha com as filhas, com medo das represálias do exército." A revolução sem povo sucumbiu ao silêncio da quebrada do Yu­ro. Epifania partira. •

· José de Souza Martins é professor titular de sociologia da Faculdade de Filosofia da USP

Domingo, 07 de outubro de 2007 (Folha de São Paulo)